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Então... seguindo no assunto "conceitos sobre os quais muita gente fala... mas que pouca gente entende, de fato"... hoje vamos de Shingitai!
Como sempre, vamos entender a expressão japonesa e só depois tecer os devidos comentários.
Esta expressão é composta por três ideogramas:
心 SHIN [しん] (xin): Coração, mente, espírito, alma, ânimo, intenção;
技 GI [ぎ] (gui): Técnica(s), habilidade(s), destreza(s);
体 TAI [たい] (tái): Corpo, condicionamento físico, manutenção física.
Antigamente, o treino era feito de tal forma que a importância dada a cada área era 60%, 30% e 10% respectivamente, dando atenção ao treino do “espírito” em primeiro lugar, depois às técnicas e, por fim, ao condicionamento físico... A disposição dos kanji que compõem o termo (1=Shin, 2=Gi e 3=Tai), por si só, já deixa clara a ordem das ideias expressas pelos ideogramas.
Naturalmente, dependendo do mestre ou do dōjō a proporção entre estas características poderia variar um pouco, porém a ordem de importância não mudava, (1=Shin, 2=Gi e 3=Tai), o “espírito” era sempre o ponto mais importante a ser desenvolvido, seguido pelo o aspecto técnico e físico, respectivamente.
É simples entender sobre o que se fala quando o tema são a “técnica” e o “condicionamento físico”, porém as coisas ficam bastante complicadas quando se entra no terreno do “espírito”.
E por que complica quando o assunto é esse? Porque quando se fala em “espírito” em nível marcial ocidental, salvo em raros casos, não se tem a mínima ideia de sobre o que se está falando... o mais comum é ver o tema jogado para a “transcendência”, ou ainda, a repetição de senso comum.
Vejamos o sentido do termo "espírito" no ocidente:
“A palavra “espírito” vem do latim “spirĭtus”. “Spirĭtus”, por sua vez, corresponde à palavra grega “pneuma” e que significa sopro, vento, respiração, exalação, odor, espírito, aspiração. A palavra grega pneuma, por sua vez, é equivalente a palavra hebraica “ruah” que designa em seu sentido genérico respiração e, em seu sentido específico hálito, alento vital, alma, espírito, sopro. “Spirĭtus” que também serve, no contexto teológico, para designar a vida enquanto princípio pensante [...].” (http://www.aquinate.net/)
Analisemos os conceitos no oriente:
心 SHIN しん] (xin) - Coração, mente, espírito, alma, ânimo, intenção.
“Shin é uma palavra que tem uma variedade de significados, dependendo do contexto. Conceito muito ambíguo, abstrato, ação mental humana ou de (criaturas), emoção, vontade, conhecimento, compaixão, etc... Shin passou a significar o que você não pode ver. [...].” (https://ja.wikipedia.org/wiki/%E5%BF%83)
Muitas vezes o conceito Shin é confundido com outro semelhante, Seishin:
精神 SEISHIN [せいしん] (ssêxin) - Coração, mente, espírito, alma, ânimo, intenção.
“Seishin tem sido utilizado, muitas vezes, com o sentido igual, aos termos: Pneuma (grego), Spirĭtus (latim), Spirit (inglês), Esprit (francês), Geist (alemão). [...]” (https://ja.wikipedia.org/wiki/%E7%B2%BE%E7%A5%9E)
De fato, ambos os conceitos possuem algumas traduções em comum, porém “Shin” está ligado, através da ideia que transmite, a ação mental... a vontade... ao conhecimento. Enquanto, “Seishin” está mais próximo a mentalidade ocidental, aonde é usado para tentar explicar a parte imaterial do ser humano.
O problema dos ocidentais é que além de desconhecer contextos (e nem procurar conhecer)... também desconhecem (em sua grande maioria) a língua japonesa. Isso é algo compreensível, porém menos compreensível é querer explicar, dentro de suas crenças, coisas distintas como sendo a mesma coisa. Quando vemos as palavras "Shin" e "Seishin" romanizadas, de fato, até parecem possuir alguma relação... afinal de contas o "Shin" está lá, em ambas... o mesmo acontece, por aqui, com muitos outros termos utilizados nas artes marciais de origem oriental. A coisa muda de figura (de contexto e significado) quando os kanji, 心 (Shin) e 精神 (Seishin), são apresentados, pois até crianças são capazes de identificar que se tratam de palavras distintas.
O problema dos ocidentais é que além de desconhecer contextos (e nem procurar conhecer)... também desconhecem (em sua grande maioria) a língua japonesa. Isso é algo compreensível, porém menos compreensível é querer explicar, dentro de suas crenças, coisas distintas como sendo a mesma coisa. Quando vemos as palavras "Shin" e "Seishin" romanizadas, de fato, até parecem possuir alguma relação... afinal de contas o "Shin" está lá, em ambas... o mesmo acontece, por aqui, com muitos outros termos utilizados nas artes marciais de origem oriental. A coisa muda de figura (de contexto e significado) quando os kanji, 心 (Shin) e 精神 (Seishin), são apresentados, pois até crianças são capazes de identificar que se tratam de palavras distintas.
Sendo assim, a forma com que o aspecto Shin nos é mostrado (geralmente fora de contexto e como se de "Seishin" se tratasse) faz, de fato, com que façamos muitas confusões e tenhamos muitas reticências a respeito de sua utilidade e, até mesmo, de sua existência.
"[...] O “contexto” é capaz de explicar praticamente tudo a respeito das artes marciais japonesas, desde que entendido corretamente [...]. Sendo assim, em primeiro lugar, é necessário “posicionar” o assunto no contexto correto!
[...] Falar sobre “espírito” ou “espiritualidade” implica saber “onde” e “como” esta “espiritualidade” está inserida (e) quando da sua utilização (nas) artes marciais.
Então, vamos a uma pergunta fundamental e crucial: “O que é o ‘espírito’ dentro do contexto marcial?”
O “espírito marcial” a que se refere a expressão Shingitai [...] é visível nas palavras dos mestres antigos:
“Mesmo que Buda e os Deuses sejam importantes, não dependa das suas providências.” (Musashi Miyamoto - "Os 21 preceitos do Dokkōdō.")
“A vitória será verdadeira, justa ou correta na medida em que for sobre nós mesmos e todos os dias temos a chance de alcançá-la.” (Morihei Ueshiba - Fundador do Aikidō.)
“Se alguém se esforçar (realmente), atingirá os seus objetivos.” (Jigorō Kanō - Fundador do Jūdō.)
Por Shin, "espírito", entenda-se a seguinte expressão: “Só pare de lutar depois de morto!”
[...] O “espírito marcial” [...] é a nossa determinação, é a nossa vontade, o nosso empenho particular [...].
[...] Portanto, [...] o “espírito” [...] é apenas a expressão do nosso esforço diário, dentro ou fora do dōjō, ajudando-nos a levantar a cada queda, com determinação e empenho, tornando-nos mais fortes a cada dia, independente da idade, do sexo, da constituição física ou do grau técnico [...].
O que comprova que o treino do “espírito” (aquilo que nos faz avançar e a superar as nossas próprias dificuldades) é «ou deveria ser», realmente, o ponto mais importante a ser trabalhado.
[...] É justamente a respeito do “espírito marcial”, do “espírito de guerreiro” que faz referência a expressão Shingitai...
Quando autores ocidentais abordam o assunto Shingitai, frequentemente o ideograma Shin “espírito” remete [...] as “forças invisíveis”. [...] Como este pensamento [...] exige uma justificativa para a qual não há qualquer fundamentação efetiva que o conecte diretamente com as artes marciais, os disparates começam a surgir [...]." (GOULART, 2011)
No entanto, fica aqui um alerta... quando falo que o condicionamento é cerca de 10% e que a técnica é 30% do total do que concebemos como arte marcial, não estou, de forma alguma, dizendo que o condicionamento físico e o treino técnico devam ser negligenciados... ao contrário... devem ser praticados de forma correta, periodicamente e de forma disciplinada se quisermos obter sucesso... caso contrário se está fadado ao fracasso. Contudo, negligenciar o espírito também não ajudará em nada na conquista de resultados (sejam eles quais forem).
Colocarei as coisas nos seguintes termos... para que não fique nenhuma dúvida...
O condicionamento físico é muito importante... a técnica é muito, muito importante e o espírito é muitíssimo importante... sendo assim nenhum dos elementos deve ser negligenciado.
Denis Andretta, Porto Alegre, Rio Grande do Sul.
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Referências:
BERNARDO, Alexandre Pinheiro; at al. História da Educação Física: Karatedō. Rede Metodista de Educação do Sul (IPA). Porto Alegre, Rio Grande do Sul, 2007.
CLARKE, Michael. Martial Arts: Defining Martial Concepts - Shin Gi Tai - Karate Training for Body, Mind, and Spirit. Fighting Arts. Disponível em: http://www.fightingarts.com/reading/article.php?id=694. Acesso em: 16 de Setembro de 2013.
ENKAMP, Jesse. Shin-Gi-Tai: The Definition of a True Sensei. Karate Nerd. Disponível em: http://www.karatebyjesse.com/shin-gi-tai-the-definition-of-a-true-sensei/. Acesso em: 7 de Janeiro de 2012.
FAITANIN, Paulo. Alma: etimologia, sentido, significado e referência! ISSN 1808-5733. Disponível: http://www.aquinate.net/. Acesso em: 6 de Fevereiro de 2016.
GOULART, Joséverson. As fases do conhecimento. Jōji Monogatari. Disponível em: http://jojimonogatari.blogspot.com. Acesso em: 27 de Novembro de 2011.
GOULART, Joséverson. FAQ: 01. O que significa Shingitai 心技体? Jōji Monogatari. Disponível em: http://jojimonogatari.blogspot.com. Acesso em: 27 de Novembro de 2011.
GOULART, Joséverson. O “Shin” de “Shin-Gi-Tai”. Jōji Monogatari. Disponível em: http://jojimonogatari.blogspot.com. Acesso em: 27 de Novembro de 2011.
GOULART, Joséverson. Shin-Gi-Tai. Disponível em: http://judoforum.com/blog/joseverson/index.php. Acesso em 20 de Novembro de 2006.
GOULART, Joséverson. Shin-Gi-Tai. Disponível em: http://groups.google.com/group/andretta-no-kenkyushitsu/. Acesso em: 2 de Fevereiro de 2011.
J-TALK NIHONGO. Japanese Dictionary: Termos diversos. Disponível em: http://nihongo.j-talk.com/search/index.php. Acesso em: 22 de Outubro de 2011.
J-TALK NIHONGO. Kanji Converte: Kanji Diversos. Disponível em: http://nihongo.j-talk.com/. Acesso em: 22 de Outubro de 2011.
MARINHEIRO, Carlos Marinheiro. A etimologia de espírito. Ciber Dúvidas da Língua Portuguesa. Disponível em: https://ciberduvidas.iscte-iul.pt/. Acesso em: 6 de Fevereiro de 2016.
ROMAJI.ORG. Rōmaji Translator (Translate japanese text (Kanji,Hiragana,Katakana) into Rōmaji or Hiragana). Disponível em: <http://www.romaji.org/>. Acesso em: 1 de Abril de 2009.
ZIMERMAN, David E. Etimologia de Termos Psicanalíticos. Porto Alegre, Editora Artmed, 2012.
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